SOLAR BOAT
Baseada em encontros gravados individualmente com um guia turístico, uma criança bilingue, uma bióloga conservacionista, um motard, um prematuro e um transformista, “Solar Boat” é uma peça sonora centrada em noções de resgate e sobrevivência.
Através de um estado alucinatório que fala de uma paisagem exterior, mas também de uma paisagem psicológica, a peça presta atenção tanto ao conteúdo de determinada enunciação, como à forma como se enuncia. O resultado é um convite para uma reflexão sobre a morte como limite num elogio à noção de transitoriedade.
A peça foi comissariada para a BoCA — Bienal das Artes Contemporâneas, no âmbito do programa “Quero ver as minhas montanhas”, com curadoria de Delfim Sardo e Sílvia Gomes, em Faro, com inauguração em Setembro de 2021, tendo sido instalada como uma viagem de de ida e volta à Ilha Deserta, na Ria Formosa, num barco solar, com o apoio From Here.
Um agradecimento especial a Afonso Ferreira, Avelino Sousa, Delfim Sardo, Fábia Azevedo, José Jesus, John Romão, Lauro de Brito, Leonor de Brito, Manuel Pereira, Sílvia Gomes e Zé Manuel.
Solar Boat, 2021
Som estéreo transferido para disco de vinil, 10’32”
Gira-discos e altifalantes sobre veículo
Língua: PT, EN
Até os vilões podem ter um lado bom.
Oh! Como o Megamind!
Vês? Como o Megamind.
Porque é que ele se chama Megamind?
Porque ele tem um cérebro enorme, uma grande mente.
Porquê?
Porquê? Porque ele é um extraterrestre.
Oh! Como o Megamind!
Vês? Como o Megamind.
Oh! Os cocos têm água dentro! Coco! Já viste uma tarantula? Eu já vi duas. E vi cobras, e baratas, um peixe-neon e um papagaio! E um lagarto.
Um camaleão: Vocês já viram como é que os camaleões andam, não é? Andam assim... de uma forma assim esquisita e vão-se abanando, para a frente, para trás, e ficam meios paralisados. Muitas vezes estão a atravessar uma estrada e fazem isso. Porque eles estão a tentar imitar um folha nas árvores. Com o vento a abanar.
Um camaleão... Folha nas árvores... Com o vento a abanar...
Vrrrumm. Red line. 300 km/h na autoestrada… Outra coisa é um gajo sentir aquele motor a roncar. A velocidade é uma coisa que dá adrenalina!
Com o vento a abanar…
Vrrrumm.
Um camaleão…
Vrrrumm.
Folha nas árvores…
Vrrrumm.
Com o vento a abanar…
Vrrrumm. Red line. 300 km/h na autoestrada… Outra coisa é um gajo sentir aquele motor a roncar. A velocidade é uma coisa que dá adrenalina!
Nunca gramei cowboys.
O nosso destino não somos nós que fazemos. O destino nasce connosco. Sou fadista. Não sou fadista de cantar com voz própria. Mas sinto naquilo que faço o que é o Fado, o que é o sentimento do Fado. Eu não tive irmãs. Ninguém me ensinou a brincar. Ninguém me ofereceu uma boneca. Não havia um baton em minha casa. Ninguém me ensinou a lavar roupa. Por favor. Ninguém me ensinou a gostar de homens. E eu gosto.
Com um mamífero crias uma ligação completamente diferente. Tentamos distanciar-nos. A ligação é muito mais intense. São muito mais parecidos com nós.
O nosso destino não somos nós que fazemos. O destino nasce connosco. Sou fadista. Não sou fadista de cantar com voz própria. Mas sinto naquilo que faço o que é o Fado, o que é o sentimento do Fado.
Vai fazer três anos. Três anos que o meu melhor amigo de infância se suicidou. E só há um mês e tal é que consegui olhar para ele e não chorar. Tenho um bocado a visão que a morte há-de chegar a qualquer pessoa, em diferentes situações, vai acontecer algum dia. A árvore onde ele se suicidou era literalmente ao lado da casa dele. E há ali um recinto que eu não conseguia passar. Sentia uma barreira corporal. Eu não consigo ir para aqui.
Há um truque muito simples que nós usamos que é tapar a cabeça dos animais. E isso serve não só para eles stressarem menos, para ficarem muito mais calmos, para não estarem a visualizar, para não estarem em contacto connosco... mas também para nós.